Apelidada de “Liberdade econômica”, a MP 881 é dúbia em relação a melhorar o ambiente de negócios e pode ser usada para penalizar o trabalhador.
Por Lorena Dourado e Rosylli Oliveira*
A Medida Provisória 881, apelidada pelo Governo como MP da “Liberdade Econômica”, foi aprovada na Câmara dos Deputados na noite de terça feira (13/08) e no Senado uma semana depois. Com o pretexto de melhorar o ambiente de negócios no Brasil, a fim de contribuir para a geração de emprego e fomento do empreendedorismo, o texto-base da MP preconiza o não intervencionismo do Estado no âmbito empresarial.
O princípio base para a “desburocratização” nas relações entre trabalhador e empregador é a presunção da “simetria das partes nas relações interempresariais”. De forma simples, o patrão e o empregado são colocados em pé de igualdade, com a independência para definir seus acordos e contratos.
Na vida real sabemos que essa idealizada simetria não existe. Os contratos mediam não só relações econômicas, mas de poder. Uma medida que decorre disso, e causou conflito no plenário, é a autorização do “ponto de exceção”. Nesses casos, o trabalhador só deverá registrar as horas extras ou atrasos, do contrário significa que ele cumpriu a jornada de trabalho regular. Isso poderá fazer com que as empresas pressionem o funcionário a fazer jornadas maiores sem registro e sem o devido pagamento das horas extras. E empresas de até 20 funcionários são desobrigadas a ter qualquer tipo de registro de ponto.
A liberação para trabalho em dias de descanso iria contra previsões da Constituição no artigo 7º, de acordo com a Juíza Noemia Porto, presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra). Até então, o trabalho aos domingos era permitido somente por meio de convenção coletiva ou ato do governo federal. Com a MP, as empresas poderão exigir que qualquer funcionário trabalhe aos domingos e feriados, com a restrição de que a cada quatro domingos trabalhados haja, obrigatoriamente, uma folga no domingo seguinte (esse item foi depois derrubado no Senado).
Na tentativa de abrir caminho para a livre iniciativa resgatar o crescimento, a MP dispensa a exigência de alvará de funcionamento, sanitário e ambiental para pequenos negócios considerados de “baixo risco”. Para negócios que não se enquadrem na medida anterior, a MP estabelece um prazo máximo de resposta pelas autoridades para pedidos de licença ou alvará, e, caso o prazo expire, a aprovação se dará automaticamente pelo silêncio.
Ou seja, são medidas ao crescimento pelo lado da oferta e que buscam melhorar o ambiente institucional, a segurança jurídica e incentivar a inovação. O primeiro ponto que gostaríamos de destacar é que incentivar a produção, exclusivamente, não é suficiente para retomar o crescimento. E os números vêm mostrando isso. Em Nota Informativa, por meio de uma simples regressão econométrica, o governo estima um efeito potencial da MP 881/2019 em um ganho no longo prazo (horizonte de 10 a 15 anos) de 7% do PIB per capita e de 4% na população ocupada. No curto e médio prazo, porém, apesar de uma reforma trabalhista aprovada e de uma reforma da previdência encaminhada ao Senado, a previsão de crescimento só se reduz.
Conforme Relatório Focus de junho deste ano, a expectativa de crescimento do PIB para 2019, antes em 1,13%, foi rebaixada para 1%. A estimativa de crescimento do governo que estava 1,6% (em maio) foi cortada para 0,81% (em julho), taxa próxima à esperada também pelo mercado em Relatório Focus de agosto (0,83%). Evidente que sem a recuperação do consumo, via crédito e/ou transferências de renda, o mercado, na verdade, tem aumentado a sua (des)confiança na economia brasileira.
Ainda que concordássemos que o ambiente de negócios seja um ponto a ser melhorado no país, o texto dessa medida é dúbio e pode ser usado para penalizar o trabalhador, como colocado antes – vale lembrar que a versão original do relator Jerônimo Goergen (PP-RS) era ainda mais dura, com vários artigos polêmicos. Outro ponto é que não existe sistema de inovação em um país sem participação de um Estado empreendedor, como sustenta a autora Mariana Mazzucato no livro “Estado empreendedor – desmascarando o mito do setor público vs. setor privado”. Tanto o crescimento, quanto a inovação são dependentes de um Estado ativo, em cooperação com o setor privado.
O que quisemos mostrar neste texto, portanto, é que a MP 881 está em continuidade com um conjunto de reformas, apresentadas há muito como solução para o país. Mas ela não serve àquilo que se propõe; o tão famigerado mercado continua, meses seguidos, com previsões pessimistas para o crescimento econômico. Não bastasse a sua inutilidade para o crescimento, traz pontos sensíveis aos empregados. Nada de novo, seguimos retrocedendo.
O princípio base para a “desburocratização” nas relações entre trabalhador e empregador é a presunção da “simetria das partes nas relações interempresariais”. De forma simples, o patrão e o empregado são colocados em pé de igualdade, com a independência para definir seus acordos e contratos.
Na vida real sabemos que essa idealizada simetria não existe. Os contratos mediam não só relações econômicas, mas de poder. Uma medida que decorre disso, e causou conflito no plenário, é a autorização do “ponto de exceção”. Nesses casos, o trabalhador só deverá registrar as horas extras ou atrasos, do contrário significa que ele cumpriu a jornada de trabalho regular. Isso poderá fazer com que as empresas pressionem o funcionário a fazer jornadas maiores sem registro e sem o devido pagamento das horas extras. E empresas de até 20 funcionários são desobrigadas a ter qualquer tipo de registro de ponto.
A liberação para trabalho em dias de descanso iria contra previsões da Constituição no artigo 7º, de acordo com a Juíza Noemia Porto, presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra). Até então, o trabalho aos domingos era permitido somente por meio de convenção coletiva ou ato do governo federal. Com a MP, as empresas poderão exigir que qualquer funcionário trabalhe aos domingos e feriados, com a restrição de que a cada quatro domingos trabalhados haja, obrigatoriamente, uma folga no domingo seguinte (esse item foi depois derrubado no Senado).
Na tentativa de abrir caminho para a livre iniciativa resgatar o crescimento, a MP dispensa a exigência de alvará de funcionamento, sanitário e ambiental para pequenos negócios considerados de “baixo risco”. Para negócios que não se enquadrem na medida anterior, a MP estabelece um prazo máximo de resposta pelas autoridades para pedidos de licença ou alvará, e, caso o prazo expire, a aprovação se dará automaticamente pelo silêncio.
Ou seja, são medidas ao crescimento pelo lado da oferta e que buscam melhorar o ambiente institucional, a segurança jurídica e incentivar a inovação. O primeiro ponto que gostaríamos de destacar é que incentivar a produção, exclusivamente, não é suficiente para retomar o crescimento. E os números vêm mostrando isso. Em Nota Informativa, por meio de uma simples regressão econométrica, o governo estima um efeito potencial da MP 881/2019 em um ganho no longo prazo (horizonte de 10 a 15 anos) de 7% do PIB per capita e de 4% na população ocupada. No curto e médio prazo, porém, apesar de uma reforma trabalhista aprovada e de uma reforma da previdência encaminhada ao Senado, a previsão de crescimento só se reduz.
Conforme Relatório Focus de junho deste ano, a expectativa de crescimento do PIB para 2019, antes em 1,13%, foi rebaixada para 1%. A estimativa de crescimento do governo que estava 1,6% (em maio) foi cortada para 0,81% (em julho), taxa próxima à esperada também pelo mercado em Relatório Focus de agosto (0,83%). Evidente que sem a recuperação do consumo, via crédito e/ou transferências de renda, o mercado, na verdade, tem aumentado a sua (des)confiança na economia brasileira.
Ainda que concordássemos que o ambiente de negócios seja um ponto a ser melhorado no país, o texto dessa medida é dúbio e pode ser usado para penalizar o trabalhador, como colocado antes – vale lembrar que a versão original do relator Jerônimo Goergen (PP-RS) era ainda mais dura, com vários artigos polêmicos. Outro ponto é que não existe sistema de inovação em um país sem participação de um Estado empreendedor, como sustenta a autora Mariana Mazzucato no livro “Estado empreendedor – desmascarando o mito do setor público vs. setor privado”. Tanto o crescimento, quanto a inovação são dependentes de um Estado ativo, em cooperação com o setor privado.
O que quisemos mostrar neste texto, portanto, é que a MP 881 está em continuidade com um conjunto de reformas, apresentadas há muito como solução para o país. Mas ela não serve àquilo que se propõe; o tão famigerado mercado continua, meses seguidos, com previsões pessimistas para o crescimento econômico. Não bastasse a sua inutilidade para o crescimento, traz pontos sensíveis aos empregados. Nada de novo, seguimos retrocedendo.
*Lorena Dourado é graduanda em Ciências Econômicas na Unicamp. Rosylli Oliveira é graduanda em Ciências Econômicas na Unicamp.