Todos nós falamos muito sobre os níveis exorbitantes dos juros no Brasil, mas é importante saber quem os recebe e quem os paga.
Por Nelson Marconi*
Com base nos dados do IBGE (Contas Econômicas Integradas, que integram as Contas Nacionais), é possível calcular, para cada um dos grandes setores da economia, a quantia paga e recebida de juros, e calcular o saldo líquido, se positivo ou negativo. A soma de todos os setores é zero, pois uns pagam aos outros, mas o que interessa é saber quem está se beneficiando e quem está sendo prejudicado nessa ciranda financeira que vivemos. É o que mostro a seguir.
No gráfico abaixo, valores negativos representam quem paga mais juros do que recebe, e positivos quem recebe mais juros do que paga. Algumas constatações são óbvias e velhas conhecidas: o governo tem um saldo negativo, e o setor financeiro, um saldo positivo, bem como os demais países em relação ao Brasil (chamados de resto do mundo). Porém, há dois resultados que não são óbvios e as pessoas talvez os desconheçam: as famílias (as pessoas físicas) apresentam saldo positivo e as empresas não financeiras (produtivas) apresentam resultado praticamente equilibrado. O que esses resultados significam?
Primeiro, em relação às famílias, é preciso lembrar que mesmo havendo muitas pessoas endividadas, há uma parcela da população, certamente os mais ricos, que não se encontra nessa situação e ganha com o crescente endividamento do setor público e os juros pagos por ele. Isso aumenta a renda dos mais ricos e sua respectiva capacidade para gastar, mas por outro lado, como o restante dos consumidores é prejudicado com os juros altos, o efeito final sobre a demanda e o emprego é negativo. O resultado é uma concentração da renda, ainda maior, em poder dos mais ricos, que por consequência resistem à queda da taxa de juros, ainda que, a médio prazo, eles estejam dando um tiro no pé, pois a redução da demanda e do emprego, decorrente, dentre outros, dos juros elevados, também diminuirá a sua renda em algum momento; mas, enquanto esse efeito não prevalece, eles torcem por continuar auferindo suas receitas financeiras e com isso neutralizar o impacto da recessão. É uma forma de compensação para a crise, à qual somente um grupo muito restrito tem acesso.
Já no mundo das empresas produtivas, uma boa parte delas está endividada, como sabemos, mas outra parte, em situação um pouco melhor, aloca suas receitas em aplicações financeiras que geram melhores resultados que a esfera produtiva. Por isso o resultado líquido do pagamento/recebimento de juros, para esse setor, é praticamente nulo. Novamente, o impacto sobre a sociedade ocorre na forma de queda da produção, emprego e demanda. As empresas produtivas também foram desenvolvendo mecanismos para se proteger da prática de juros elevados e dedicam uma parcela de suas atividades a encontrar formas de ganhar receitas no mercado financeiro. Esse é outra consequência da prática de uma política de juros altos por tanto tempo.
E o governo, bem, o governo é sempre o grande pagador desses juros. Podemos dizer que é um pobre coitado? Não é bem assim. Certamente há uma pressão dos grupos que ganham mais com as taxas de juros elevadas, e as próprias regras de funcionamento do sistema bancário e de financiamento da dívida pública ajudam, mas se o governo apresentasse uma situação fiscal melhor, certamente poderia bancar uma política de juros mais reduzidos e reduzir sua dívida. Esse é um dos motivos pelos quais defendemos tanto o ajuste fiscal – para fortalecer o cacife do governo e possibilitar que o Banco Central pratique uma redução maior da taxa de juros.
Quando isso ocorrer, o comportamento do gráfico abaixo vai se alterar razoavelmente; os mais ricos vão ganhar menos com as aplicações financeiras, mas poderão ganhar mais se aplicarem seus recursos nas bolsas de valores ou emprestarem às empresas para realizarem seus investimentos; as empresas idem, e mais pessoas ingressarão no mercado de trabalho e aumentarão sua renda. As famílias menos abastadas também poderão elevar sua renda.
Melhorar a situação fiscal e reduzir a taxa de juros são essenciais para a retomada do crescimento. Ah, mas alguém pode argumentar que a melhoria da situação fiscal não será suficiente para reduzir a taxa de juros aos chamados tomadores finais….concordo plenamente que isso poderá ser verdade. E pretendemos entrar firme nessa briga para também realizar as demais medidas necessárias para a redução dos juros (já citadas em parágrafo anterior).
Pelo que discuti acima, sabemos que haverá muita resistência para reduzir os juros por parte de quem está ganhando com a situação atual. Se o governo não estiver bem das pernas, isso é, fiscalmente saudável, não há como entrar nessa briga. E, uma vez bem das pernas, nós iremos perseguir esse objetivo, essencial para conseguirmos recriar os empregos que o país precisa.
No gráfico abaixo, valores negativos representam quem paga mais juros do que recebe, e positivos quem recebe mais juros do que paga. Algumas constatações são óbvias e velhas conhecidas: o governo tem um saldo negativo, e o setor financeiro, um saldo positivo, bem como os demais países em relação ao Brasil (chamados de resto do mundo). Porém, há dois resultados que não são óbvios e as pessoas talvez os desconheçam: as famílias (as pessoas físicas) apresentam saldo positivo e as empresas não financeiras (produtivas) apresentam resultado praticamente equilibrado. O que esses resultados significam?
Primeiro, em relação às famílias, é preciso lembrar que mesmo havendo muitas pessoas endividadas, há uma parcela da população, certamente os mais ricos, que não se encontra nessa situação e ganha com o crescente endividamento do setor público e os juros pagos por ele. Isso aumenta a renda dos mais ricos e sua respectiva capacidade para gastar, mas por outro lado, como o restante dos consumidores é prejudicado com os juros altos, o efeito final sobre a demanda e o emprego é negativo. O resultado é uma concentração da renda, ainda maior, em poder dos mais ricos, que por consequência resistem à queda da taxa de juros, ainda que, a médio prazo, eles estejam dando um tiro no pé, pois a redução da demanda e do emprego, decorrente, dentre outros, dos juros elevados, também diminuirá a sua renda em algum momento; mas, enquanto esse efeito não prevalece, eles torcem por continuar auferindo suas receitas financeiras e com isso neutralizar o impacto da recessão. É uma forma de compensação para a crise, à qual somente um grupo muito restrito tem acesso.
Já no mundo das empresas produtivas, uma boa parte delas está endividada, como sabemos, mas outra parte, em situação um pouco melhor, aloca suas receitas em aplicações financeiras que geram melhores resultados que a esfera produtiva. Por isso o resultado líquido do pagamento/recebimento de juros, para esse setor, é praticamente nulo. Novamente, o impacto sobre a sociedade ocorre na forma de queda da produção, emprego e demanda. As empresas produtivas também foram desenvolvendo mecanismos para se proteger da prática de juros elevados e dedicam uma parcela de suas atividades a encontrar formas de ganhar receitas no mercado financeiro. Esse é outra consequência da prática de uma política de juros altos por tanto tempo.
E o governo, bem, o governo é sempre o grande pagador desses juros. Podemos dizer que é um pobre coitado? Não é bem assim. Certamente há uma pressão dos grupos que ganham mais com as taxas de juros elevadas, e as próprias regras de funcionamento do sistema bancário e de financiamento da dívida pública ajudam, mas se o governo apresentasse uma situação fiscal melhor, certamente poderia bancar uma política de juros mais reduzidos e reduzir sua dívida. Esse é um dos motivos pelos quais defendemos tanto o ajuste fiscal – para fortalecer o cacife do governo e possibilitar que o Banco Central pratique uma redução maior da taxa de juros.
Quando isso ocorrer, o comportamento do gráfico abaixo vai se alterar razoavelmente; os mais ricos vão ganhar menos com as aplicações financeiras, mas poderão ganhar mais se aplicarem seus recursos nas bolsas de valores ou emprestarem às empresas para realizarem seus investimentos; as empresas idem, e mais pessoas ingressarão no mercado de trabalho e aumentarão sua renda. As famílias menos abastadas também poderão elevar sua renda.
Melhorar a situação fiscal e reduzir a taxa de juros são essenciais para a retomada do crescimento. Ah, mas alguém pode argumentar que a melhoria da situação fiscal não será suficiente para reduzir a taxa de juros aos chamados tomadores finais….concordo plenamente que isso poderá ser verdade. E pretendemos entrar firme nessa briga para também realizar as demais medidas necessárias para a redução dos juros (já citadas em parágrafo anterior).
Pelo que discuti acima, sabemos que haverá muita resistência para reduzir os juros por parte de quem está ganhando com a situação atual. Se o governo não estiver bem das pernas, isso é, fiscalmente saudável, não há como entrar nessa briga. E, uma vez bem das pernas, nós iremos perseguir esse objetivo, essencial para conseguirmos recriar os empregos que o país precisa.
*Nelson Marconi é graduado em economia pela PUC-SP, mestre e doutor em economia pela FGV e SP professor adjunto dos cursos de graduação, mestrado e doutorado acadêmico e mestrado profissional em Administração Pública e Governo, na FGV-SP.
Fonte: Portal Disparada, 24 de julho de 2018.