Em maio de 2025, o Supremo Tribunal Federal proferiu importante decisão no bojo da Reclamação Constitucional nº 67.042, ajuizada por uma instituição financeira, em face de acórdão da 5ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho.

A discussão girou em torno da aplicação do artigo 840, §1º, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que, com a redação dada pela reforma trabalhista (Lei nº 13.467/2017), passou a exigir que os pedidos formulados na petição inicial da reclamação trabalhista sejam “certos, determinados e com indicação de seu valor”.

No caso analisado, o STF entendeu que a Turma do TST, ao afastar a aplicação desse dispositivo legal com base em princípios constitucionais incorreu em violação à chamada cláusula de reserva de plenário, prevista no artigo 97 da Constituição e reafirmada pela Súmula Vinculante nº 10.

Apesar da grande repercussão da decisão, é preciso esclarecer que o Supremo não decidiu, em nenhum momento, que a condenação na Justiça do Trabalho deve obrigatoriamente se limitar aos valores indicados na petição inicial. O que se julgou foi um vício de natureza formal e processual, decorrente do fato de que a Turma do TST afastou a aplicação de norma infraconstitucional — o referido §1º do artigo 840 da CLT — sem observância do quórum qualificado exigido pela Constituição para o controle difuso de constitucionalidade.

De acordo com o STF, ao afastar o dispositivo com base em fundamentos constitucionais, a Turma atuou como se tivesse declarado, ainda que de forma implícita, a inconstitucionalidade da norma, o que só poderia ser feito pelo Pleno ou pelo Órgão Especial do tribunal.

Nesse sentido, a decisão do STF deve ser compreendida como uma reafirmação do devido processo constitucional, não como uma manifestação de mérito sobre a limitação da condenação ao valor indicado na inicial.

O mérito da controvérsia — isto é, a possibilidade ou não de limitar a condenação trabalhista ao valor dos pedidos líquidos indicados na petição inicial — permanece em debate no âmbito do Tribunal Superior do Trabalho.

A matéria foi formalmente afetada como Tema Repetitivo nº 35, por meio do Incidente de Recurso de Revista Repetitivo (IRR) nº 1199-29.2021.5.09.0654, que aguarda julgamento pelo Pleno da Corte. Até que isso ocorra, os entendimentos sobre a questão seguem sendo construídos de forma fragmentada, sem força vinculante.

Limitação da condenação

Dentro desse contexto, um novo desdobramento ocorreu no início do mês de julho, quando o ministro Alexandre Ramos, integrante da 4ª Turma do TST, proferiu decisão monocrática no processo nº 0011049-20.2020.5.15.0026, reformando acórdão do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região para limitar a condenação aos valores indicados na petição inicial.

No caso, o reclamante havia atribuído valor inicial de R$ 1,58 milhão, posteriormente emendado para R$ 2,29 milhões, mas a condenação imposta superou esse montante. O TRT manteve a sentença, sob o fundamento de que os valores indicados seriam apenas estimativas, sem força vinculante para fins de liquidação.

O ministro, contudo, entendeu de forma diversa. Fundamentou sua decisão no artigo 492 do Código de Processo Civil, segundo o qual o juiz não pode proferir sentença condenatória em quantia superior àquela demandada.

Para o relator, se os pedidos foram líquidos, certos e determinados na petição inicial, o julgador está vinculado aos valores atribuídos a cada item, salvo justificativa expressa e fundamentada para a adoção de valores meramente estimativos. Como essa justificativa não foi apresentada no caso, o ministro entendeu pela necessidade de limitação da condenação.

Chama atenção, ainda, o fato de que o ministro se afastou expressamente do precedente firmado pela SDI-1 do TST em 2023, que havia fixado tese no sentido de que os valores constantes da petição inicial possuem caráter meramente estimativo e não vinculam a condenação. Para ele, como seis ministros estavam ausentes no julgamento da SDI-1, o acórdão ali proferido não teria força para alterar o entendimento consolidado da 4ª Turma, à qual está vinculado.

Com isso, o que se observa é que, embora o STF não tenha decidido sobre o mérito da limitação do valor da condenação, sua atuação recente — ao cassar decisões da 5ª Turma do TST que afastaram o artigo 840, §1º da CLT sem observar o quórum constitucional — tem contribuído para reorientar a jurisprudência trabalhista.

Aliás, o posicionamento do STF tem se repetido em outras reclamações constitucionais. O ministro Alexandre de Moraes, na Reclamação 79.034/SP, assim como o ministro Gilmar Mendes na Reclamação 77.179 cassaram acórdãos do TST que tratava os valores da inicial como “mera estimativa”, justamente por afastar o artigo 840, §1º, da CLT com fundamento constitucional sem observância da cláusula de reserva de plenário.

O entendimento monocrático do ministro Gilmar Mendes foi mantido integralmente pela 2ª Turma do STF no início do mês de outubro ao rejeitar o recurso da parte trabalhadora contra a decisão individual do relator.

Assim, a decisão do ministro Alexandre Ramos do TST pode ser lida como reflexo desse novo entendimento que se consolida, pois, ainda que o mérito esteja pendente de julgamento pelo Pleno do TST, já se vê uma tendência de maior cautela por parte dos ministros, diante da sinalização clara do STF de que o processo constitucional deve ser rigorosamente respeitado.

Em conclusão, é necessário evitar generalizações apressadas. O STF não decidiu que a condenação na Justiça do Trabalho deve, em qualquer hipótese, se limitar aos valores indicados na petição inicial. O que decidiu foi que o afastamento dessa norma legal, por violação a princípios constitucionais, exige deliberação do Pleno do Tribunal, sob pena de nulidade da decisão proferida por órgão fracionário.

Enquanto, por outro lado, o debate de fundo continua em aberto e deverá ser resolvido no julgamento do Tema Repetitivo nº 35 pelo TST, momento em que se firmará — ou não — um novo marco interpretativo para o processo do trabalho na era pós-reforma trabalhista.

CONJUR

https://www.conjur.com.br/2025-out-27/limitacao-da-condenacao-trabalhista-o-que-esta-em-jogo-entre-stf-e-tst/


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