FARSA TAREFA

Os órgãos de cúpula do Ministério Público Federal estão desvendando um dos segredos mais bem guardados da estrutura que produziu o estrondoso sucesso da apelidada "lava jato". A chave do enigma está em um esquema de distribuição viciada de processos.

A manobra centralizou nas mãos do grupo lavajatista os feitos que geram manchetes e deram a seus integrantes poder de fogo e munição para intimidar e subjugar todos os figurões da República. A técnica foi direcionar processos, mesmo sem qualquer conexão, para as mãos do grupo, desviando-os da livre distribuição.

A investigação mais avançada focaliza São Paulo onde, pelo relato, "todos os feitos desmembrados da Operação Lava Jato em outras unidades ou instâncias do MPF estão sendo subtraídos do canal de distribuição regular e remetidos diretamente à FTLJ-SP. Em outras palavras, os expedientes que chegam na PR-SP com o rótulo "Lava Jato" são direcionados à FTLJ-SP sem a prévia e imprescindível distribuição na unidade conforme as regras de organização interna aprovadas pelo Conselho Superior do MPF (CSMPF)".

O truque consistiu em inventar um "extravagante Ofício Virtual", órgão não previsto na estrutura do MPF mas que serviu de pretexto para escapar dos preceitos constitucionais da isonomia, da impessoalidade e do promotor natural. O procedimento representa evidente violação ao art. 129, §4º, combinado com art. 93, XV, da Constituição da República, como aponta representação em posse dos integrantes do Conselho Superior do MPF e do CNMP.

O primeiro registro do esquema data de 2015, quando a então procuradora-chefe em São Paulo, Anamara Osório da Silva, proibiu a livre distribuição de qualquer processo que mencionasse o apelido "lava jato", independentemente do conteúdo do feito.

Mas, "diante da reação contrária dos colegas — todos surpresos com a evidente ilegalidade de sua ordem —, acabou por recuar, mandando o caso à livre distribuição", segundo relato do procurador Thiago Lemos de Andrade.

A persistente Anamara, contudo, não desistiu. Mesmo deixando o comando regional da Procuradoria, com a ajuda de Rodrigo Janot, conseguiu restabelecer, mais tarde, a "burla à sistemática de distribuição vigente na PR-SP, "sem observância do protocolo de pesquisa de prevenção que deveria ser uniformemente aplicado a todos os feitos".

Lemos de Andrade abre parênteses: "O termo “Operação Lava Jato” vulgarizou-se de tal forma, que já não serve de parâmetro para aferição de conexão ou prevenção. Originalmente, a Operação Lava Jato de fato se referia a um caso criminal específico que tramitava perante a 13ª Vara da Justiça Federal no Paraná."

E continua: "À medida que o caso foi ganhando maior dimensão e fatos não conexos ao seu objeto original foram sendo descobertos, operaram-se desmembramentos que, uma vez remetidos às unidades e instâncias competentes, deram origem a novas investigações, para as quais mutirões também foram criados. Assim é que surgiram o Grupo de Trabalho da Lava Jato do Gabinete da Procuradoria-Geral da República e as Forças-Tarefa da Operação Lava Jato no Distrito Federal e nos Estados do Rio de Janeiro e de São Paulo. Para esses mutirões, o uso da grife "Lava Jato" não passava, como ainda não passa, de puro marketing institucional." 

Revista Consultor Jurídico