O Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro cresceu 1% nos três primeiros meses de 2017 em relação ao trimestre anterior, após oito trimestres de retração. Apesar de o governo comemorar o que considera ser o fim da recessão, muitos não vislumbram ainda o encerramento da crise. Mais que uma recuperação sustentável, o resultado indicaria um movimento cíclico natural da economia, após recessão tão profunda. “Aparentemente chegamos ao fundo do poço”, diz o economista Braulio Santiago Cerqueira.

   

  

O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, chegou a classificar este momento como “histórico”. “Depois de dois anos, o Brasil saiu da pior recessão do século”, disse, em nota. No Twitter, o presidente Michel Temer foi na mesma linha: “Acabou a recessão! Isso é resultado das medidas que estamos tomando. O Brasil voltou a crescer”, afirmou. 

Para o ministro do Planejamento, Dyogo Oliveira, o PIB “reflete um conjunto de ações de política econômica que tem sido implementado (...) e, em particular, o avanço das reformas econômicas no Congresso”.

Os números, no entanto, não justificam o otimismo oficial. O próprio Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) foi ponderado e avaliou que “ainda é cedo para falar em saída da recessão”. 

“É preciso esperar um pouco para ver o que vai acontecer este ano. A gente teve crescimento no trimestre, mas foi sobre uma base muito deprimida. Se olharmos no longo prazo, ainda estamos no mesmo nível de 2010”, disse a coordenadora de contas nacionais do órgão, Rebeca Palis.

O crescimento foi puxado, principalmente, pelo bom resultado da agropecuária, que teve expansão de 13,4%, e do comércio exterior, com as exportações subindo 4,8%. A indústria cresceu um tímido 0,9%, e os serviços registraram estabilidade. Os investimentos e o consumo das famílias sofreram contração no trimestre, respectivamente 1,6% e 0,1%. Apesar do crescimento da economia na comparação com o trimestre anterior, o PIB recuou 0,4% em relação ao primeiro período do ano passado.

O economista Braulio Santiago Cerqueira avalia que os números do PIB já eram esperados por analistas. Ele destaca que, mesmo que o crescimento de 1% se mantenha até o fim do ano – o que é improvável, já que previsões até então estimam uma ampliação de 0,5% –, a economia não chegará sequer a atingir o nível que tinha em 2011, diante do tombo provocado pela recessão nos últimos anos. 

“As quedas do PIB acumuladas nos últimos anos fizeram a economia brasileira voltar a um ponto entre 2010 e 2011. Então, mesmo se a economia crescer o dobro do que apontam as expectativas, ela não vai ter chegado ao nível sequer de 2011. Ou seja, tem que levar em conta a gravidade da recessão”, diz. 

Cerqueira ressalta ainda que o resultado positivo do semestre não anula outros números negativos. Considerando os 12 meses terminados em março deste ano, o PIB brasileiro recuou 2,3% em relação aos 12 meses imediatamente anteriores.

“Então continua caindo. De fato, na margem, houve esse pequeno crescimento, muito associado à safra de grãos. E eu diria que o fator mais importante do ponto de vista da demanda para esse resultado foi o setor externo. O consumo não recuperou e o investimento não recuperou”, reiterou, chamando atenção para o fato de que a taxa de investimento – que é o total de investimento da economia sobre o produto – encontra-se hoje no valor mais baixo de toda a série histórica do IBGE, que começa em 1995: 15,6%. 

De acordo com ele, o resultado positivo, portanto, tem pouco a ver com a política econômica praticada pela atual gestão. “Eu não associaria essa recuperação na margem da economia brasileira àquilo que o governo enfatiza, que seria um choque de confiança proporcionado pela política econômica que seria agora mais responsável. Os números não mostram isso”, defende.

O economista diz que o bom desempenho do setor externo, é fruto principalmente da desvalorização do câmbio, que ocorre desde 2015, e da depressão do mercado doméstico. “É a situação de contração da demanda interna, é natural. As empresas, os exportadores de produtos primários, se voltam mais para o mercado externo. Se você não vende aqui dentro, então você tenta vender para quem tem poder de compra no exterior.”

Para ele, mais realista do que falar em volta do crescimento, é afirmar que o país pode estar entrando agora em um período de estagnação. “O que podemos falar que está acontecendo é menos algo que aponta para um crescimento sustentável e para a recuperação de uma trajetória mais dinâmica da economia e mais que a gente chegou ao fundo do poço. Aparentemente, não dá para cavar mais fundo. Melhor que falar em recuperação, a gente pode dizer com mais cautela que a economia está parando de afundar. Estamos entrando em uma estagnação, tenderia mais a isso”, afirma. 

Segundo Cerqueira, o fato de que a economia possa estar “parando de afundar” é algo natural, próprio dos movimentos cíclicos da economia. “Como você tem um consumo e um investimento muito reduzidos, qualquer sopro que a gente experimente causa um efeito estatístico positivo. Era normal que esse momento um dia chegasse. Mas tem que ver qual será a intensidade de uma possível recuperação que ainda está para se confirmar”, pondera. 

O economista não crê que, com a atual política econômica, vá haver uma recuperação robusta. “O movimento cíclico natural da economia, independente da política econômica, aponta, sim para alguma recuperação. Mas a política econômica podia ajudar mais, acelerando o ritmo de queda da taxa de juros – não só da taxa de juros básica, mas para o crédito em geral dos bancos, os spreads – e na recuperação do investimento público e do próprio gasto público, que na verdade estão comprimidos pelas regras fiscais que a gente tem. Em razão desses fatores, não acredito em uma recuperação intensa da economia”, conclui.

     

Fonte: Vermelho, 02 de junho de 2017