REFLEXÕES TRABALHISTAS

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A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), no artigo 8º, assegura que as autoridades administrativas e a Justiça do Trabalho, na falta de disposições legais ou contratuais, decidirão, conforme o caso, pela jurisprudência, por analogia, por equidade e outros princípios e normas gerais de Direito, principalmente do Direito do Trabalho, e, ainda, de acordo com os usos e costumes, o Direto Comparado, mas sempre de maneira que nenhum interesse de classe ou particular prevaleça sobre o interesse público.

O artigo 9º da CLT, por sua vez, diz que serão nulos de pleno direito os atos praticados com o objetivo de desvirtuar ou fraudar a aplicação dos preceitos contidos na Consolidação das Leis do Trabalho.

Como se infere da leitura dos dois dispositivos legais supra, o legislador, por razões óbvias decorrentes da finalidade das normas trabalhistas, de caráter tutelar, estabeleceu parâmetros prescritivos para o operador do direito laboral, de um lado, ampliando sua atuação na busca da justiça social, pois se no direito comum se reconhece o uso da equidade somente nos casos previstos em lei (artigo 127 do CPC), no âmbito trabalhista a autorização é geral, além do auxilio dos princípios gerais de direito, da analogia, dos usos e costumes e do direito comparado. De outro lado, como se tratam de regras regedoras das relações entre pessoas desiguais, qualquer ato destinado a fraudar ou desvirtuar as normas de garantia do trabalhador são consideradas nulas de pleno direito.

Destaque na análise do artigo 8º da CLT volta-se para a equidade, pela característica marcante e peculiar que adquire no direito laboral, sendo considerada mesmo, como veremos a seguir, como o supraprincípio, como um "motor móvel" de tudo mais que se possa falar e fazer em termos de criação, interpretação e aplicação do direito do trabalho.

Como afirma Mauro Schiavi (Proteção jurídica à dignidade da pessoa humana do trabalhador): "É consenso na doutrina, com grande prestígio da jurisprudência, principalmente a dos Tribunais Superiores, que a proteção à dignidade da pessoa humana é o fundamento de todo o ordenamento jurídico e também a finalidade última do Direito. A interpretação do direito não pode estar divorciada dos princípios constitucionais e, principalmente, dos princípios que consagram direitos fundamentais. Por isso, a moderna doutrina tem se posicionado no sentido de que os princípios fundamentais da Constituição Federal têm caráter normativo, tendo aplicabilidade imediata como se regras fossem".

O Direito do Trabalho assegura piso vital mínimo de direitos e visa garantir e implementar a proteção à dignidade do trabalhador, pelo que, mesmo em época de flexibilização, desemprego e globalização da economia, não se pode perder de vista a valorização do princípio protetor desse especial ramo do direito, que é a sua razão de ser como medida de efetividade dos direitos fundamentais da pessoa humana e da realização do princípio da igualdade entre os atores sociais partícipes da relação de trabalho.

Assim, na busca de um norte para interpretar as regras trabalhistas não se pode esquecer também, da segunda norma legal mais importante no nosso sistema jurídico, a Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, que no seu artigo 5º consagra uma das mais importantes regras para o intérprete, dizendo que "Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum".

Assim, o juiz do Trabalho ("médico da feridas sociais", na feliz expressão de Amauri Mascaro Nascimento) deve, antes de aplicar a lei, interpretá-la e buscar o seu sentido e alcance, não esquecendo que a interpretação da lei é sempre sociológica e teleológica e pode resultar na ampliação da norma, na sua restrição ou na declaração de validade ou não do seu conteúdo, por meio do controle difuso.

Nesse sentido, o Poder Judiciário trabalhista tem a importante tarefa de determinar os fins sociais da lei trabalhista e o bem comum que ela visa proteger, como algo que agrada e interessa a todos, ao povo, à comunidade e não apenas a uma pequena parcela, especialmente aquela que detém o poder econômico e político.

É nessa linha que deve se guiar o intérprete e aplicador do Direito do Trabalho, especialmente no momento atual que se vive, de um "novo" direito do trabalho no rumo da 4ª revolução industrial.

 é doutor em Direito das Relações Sociais pela PUC-SP, professor titular do Centro Universitário do Distrito Federal-UDF/mestrado em Direito das Relações Sociais e Trabalhistas, membro da Academia Brasileira de Direito do Trabalho, consultor jurídico, advogado, procurador regional do Trabalho aposentado e autor de livros jurídicos, entre eles, Direito Ambiental do Trabalho e a Saúde do Trabalhador.

Revista Consultor Jurídico

https://www.conjur.com.br/2022-dez-16/reflexoes-trabalhistas-artigos-clt-farois-direito-trabalho