Neste ano, na França, as mulheres começaram a “trabalhar de graça” nesta sexta-feira (4), precisamente às 9h10 (hora local), devido às persistentes desigualdades salariais, segundo o grupo feminista Les Glorieuses (As Gloriosas), que lançou uma petição para exigir, entre outras coisas, um aumento de salários para profissões exercidas majoritariamente por mulheres.

Esta data e hora simbólicas foram calculadas a partir de estatísticas europeias sobre a diferença salarial entre mulheres e homens na França. Em 2022, as mulheres ganham em média 15,8% menos que os homens.

No ano passado, a diferença salarial atingiu 16,5%, o que fez com que a data simbólica fosse determinada em 3 de novembro, às 9h22.

As ativistas do movimento que tem como hashtag #4Novembre9h10 lançaram uma petição para exigir a implementação de três políticas públicas voltadas para a promoção da igualdade salarial. Em particular, elas pedem um aumento nos salários das profissões onde as mulheres são mais numerosas.

“Os empregos de cuidado e educação, muito feminilizados, que foram cruciais para a França nos últimos três anos [devido à pandemia de Covid-19], estão entre os empregos menos valorizados em termos de salários”, lamentou o movimento Les Glorieuses em um comunicado à imprensa.

As ativistas também defendem mudanças nas licenças maternidade e paternidade, “para que essa possa ser compartilhada entre os dois progenitores e paga de forma equivalente”, disse a economista Rebecca Amsellem , fundadora do grupo.

As Gloriosas também querem condicionar o acesso aos subsídios e empréstimos garantidos pelo Estado, ao respeito à igualdade salarial. Uma forma de “garantir que o orçamento alocado pelos fundos públicos não acentue as desigualdades”, apontam.

Senadora denuncia inação do governo para igualdade salarial

A senadora Laurence Cohen, do Partido Comunista Francês (PCF), denuncia a inação do governo de Emmanuel Macron em relação à igualdade salarial entre homens e mulheres. Em entrevista à RFI, a senadora diz que, na França, existem pelo menos 14 leis já aprovadas que penalizam empresas que pagam salários mais baixos às mulheres em relação aos homens, mas que elas não são aplicadas. 

“Não podemos ser permissivos com os que não respeitam as leis. Temos que ser mais severos”, indica. Além disso, destaca ela, “o governo não dá  o exemplo”. “No setor público, assim como no privado, não se respeita a igualdade.”

E, segundo ela, falta transparência nos dois setores sobre os salários pagos a homens e mulheres.

Cohen defende que, se as mulheres ganharem salários iguais aos dos homens, isso é bom não só para elas, mas para toda a sociedade: “Com a paridade salarial, fazemos a economia girar e também aumentamos as contribuições das mulheres para o sistema de proteção social. Todo mundo sai ganhando”, explica. 

(Mais) Cem anos de desigualdades

A senadora lembra a publicação do Fórum Econômico Mundial, em 2019, que dizia que “de acordo com a trajetória atual para diminuir a desigualdade de gênero nos setores da política, economia, saúde e educação, a desigualdade global entre homens e mulheres será eliminada em 99,5 anos”. 

Segundo ela, essa disparidade se deve sobretudo à nossa sociedade patriarcal, que decidiu que lugar de mulher é em casa (mesmo quando ela trabalha fora) e trata as profissões ditas femininas (enfermeiras, cuidadoras de idosos e de crianças etc.) como secundárias. “Por julgarem ser uma habilidade natural da mulher, desqualificam essas profissões”, aponta. 

A senadora lembra que o cálculo que se faz hoje, na Europa e na França, sobre a partir de que dia as mulheres começam a trabalhar “de graça”, se deve a uma iniciativa das islandesas, nos anos 1970. 

“Em 1975, no dia em que começaram a trabalhar de graça, as mulheres da Islândia entraram em greve – recusaram-se a trabalhar, cozinhar e cuidar das crianças por um dia. Foi um momento que mudou a forma como as mulheres eram vistas no país e ajudou a colocar a Islândia na vanguarda da luta pela igualdade”, conta a senadora, que já prepara um discurso sobre isso para a segunda-feira (7), quando a pauta será a reforma da previdência francesa. 

Fonte: RFI
Texto: Paloma Varón

DMT: https://www.dmtemdebate.com.br/na-franca-a-partir-de-hoje-as-mulheres-trabalham-de-graca-entenda-o-motivo/