A democracia é polifônica. Neste sentido, a democracia é composta de multiforme variedade de vozes que convivem de forma harmônica em diversos espaços religiosos, físicos e discursivos. Entre os evangélicos, também, deve ser assim.

Álvaro Sólon de França*

Nestes tempos de embates eleitorais, alguns setores da sociedade brasileira teimam em vender a imagem que os evangélicos possuem forma hegemônica de pensar, tutelada pelos discursos de lideres religiosos midiáticos, sobre a realidade brasileira.

Esquecem que os evangélicos frequentam os supermercados, utilizam transportes coletivos, abastecem os carros, precisam dos serviços públicos de saúde e educação, sofreram e, ainda, sofrem as agruras da pandemia da covid-19 e tem os salários corroídos pelos efeitos perversos da inflação. Enfim, os evangélicos sofrem dos mesmos pesares vivenciados pela maioria esmagadora da população brasileira.

Apesar de vivermos a era da insensatez, os evangélicos ancorados nos ensinamentos inconsúteis de Jesus Cristo, não vão embarcar na nau dos insensatos, capitaneadas por gente que glorifica o parvo e possui a mente obliterada. Em suma, os evangélicos não têm as consciências deles sequestradas pelos mercantilistas da fé.

Ressalte-se que, os evangélicos têm compromisso inalienável e inarredável com os ensinamentos inconsúteis de Jesus Cristo que nos direciona para os valores fundamentais da vida que remetem à dignidade da pessoa humana, sem distinção de credo religioso, cor, raça, orientação sexual e tantas outras formas de pensar, pois dignidade humana e democracia constituem elementos inseparáveis. Vale ressaltar que a dignidade humana constitui a norma fundamental do Estado e da própria sociedade civil, inadmitindo qualquer tipo de restrição.

Os evangélicos cultivam a solidariedade, pois sem solidariedade, a dignidade humana não passa de letra morta largada, ao léu, nas estradas turbulentas da vida. A solidariedade é a mão da nossa alma alimentando a necessidade alheia. Essa é o bálsamo que minora as nossas dores coletivas e individuais, pois enobrece o espirito dos doadores e aquece os corações daqueles que a recebem. A solidariedade é a pedra angular que mantém de pé a dignidade da pessoa humana.

Martin Luther King, por ocasião da morte do presidente Kenedy, deixou para todos nós ensinamentos imemoriais, quando disse que: “Assim, em sua morte o presidente Kenedy tem muito a dizer a cada de um de nós. Ele tem a dizer a todo político que alimenta seu eleitor com o pão azedo do racismo e a carne podre do ódio. Tem algo a dizer a todo sacerdote que observa as perversidades do racismo e permanece calado por trás da segurança dos vitrais. Tem algo a dizer aos devotos da extrema direita que despejam palavras venenosas contra a Suprema Corte e as Nações Unidas e rotulam de comunistas aqueles com os quais não concordam... Ele diz a todos nós que o vírus do ódio que se inseriu nas veias da nossa nação, se não for extirpado, levará inevitavelmente à nossa ruina moral e espiritual.”

A seu turno, Bertold Brecht nos ensina que: “... não aceites o que é de hábito como coisa natural, pois em tempo de desordem sangrenta, de confusão organizada, de arbitrariedade consciente, de humanidade desumanizada, nada deve parecer natural, nada deve parecer impossível de mudar.” Do mesmo modo, o estadista Barack Obama leciona que: “A mudança não virá se esperarmos por outras pessoas ou outros tempos. Nós somos aqueles por quem estávamos esperando. Nós somos a mudança que procuramos.”

Tenho plena certeza que os evangélicos conhecem sobejamente os problemas da pobreza, da fome, do desemprego, da educação e da saúde e da violência que transformaram o Brasil num vale cheio de milhões de pessoas que, em função da privação econômica e do isolamento social, perderam a esperança.

Portanto, tenho a convicção inamovível que os evangélicos, em sua maioria acachapante, comparecerão às próximas eleições com o olhar fixo nos ensinamentos inconsúteis de Jesus Cristo, na solidariedade, na fraternidade, na busca pela dignidade humana e na esperança que podemos reduzir a pobreza e as nossas profundas desigualdades sociais e regionais, e, assim, construirmos a sociedade que todos almejamos: livre, justa e solidária.

(*) Auditor fiscal aposentado da Receita Federal do Brasil. Ex-presidente do Conselho Executivo da Anfip (Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil) e do conselho curador da Fundação Anfip de Estudos da Seguridade Social. Autor dos livros A Previdência Social é Cidadania e A Previdência Social e a Economia dos Municípios

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