A necessidade de cuidar da família e o papel social imposto pela cultura da comunidade em que vivem estão entre as barreiras enfrentadas pelas mulheres da geração "nem-nem", como são conhecidos os jovens que nem trabalham e nem estudam. A constatação está em estudo do Banco Mundial que analisou os desafios dessas mulheres, que lideram o grupo dos "nem-nem". O levantamento identifica três barreiras principais enfrentadas por esses jovens. A motivação interna, com participantes que não têm aspiração profissional ou intenção de voltar a estudar; outros que até querem trabalhar ou retornar às salas de aula, mas não agem para isso, e um último grupo que quer voltar a trabalhar e estudar, mas enfrenta barreiras externas. As mulheres formam a maioria do primeiro grupo, diz Miriam Müller, autora do estudo "Se já é difícil, imagina para mim...". "Não são problemas individuais. Elas são condicionadas à pobreza e também enfrentam normas de gênero que fazem com que as mulheres que fiquem nas primeiras duas barreiras e não se imaginem como agentes econômicos", afirma. "Elas se veem como dona de casa, e isso tem muito a ver com a falta de um modelo de mulher que conseguiu conquistar mais coisas." Nesse grupo há mulheres em uniões estáveis ou com filhos pequenos e que são afetadas por normas sociais restritivas que reforçam seu papel doméstico. ​Ana Luiza Machado, coautora do estudo, diz que fatores culturais acabam impedindo que as mulheres desenvolvam aspirações profissionais ou educacionais. "As mulheres são cuidadoras da família, têm jornada dupla e sofrem penalização social", complementa. "Em muitas comunidades visitadas, a mulher autônoma tem que lidar com parceiros ou membros da comunidade que acham que ela está saindo do lugar para achar homens. Há uma estigmatização", comenta. Há, diz o estudo, uma pressão social para desempenhar os papéis de “boas esposas e mães” para as meninas. A dependência econômica das mulheres também é naturalizada, assim como a atribuição de menos significado e prioridade ao trabalho delas e a dupla jornada. No segundo grupo, de mulheres que querem voltar a trabalhar e estudar, mas não tomam medidas para isso, a falta de ação parece estar relacionada à ausência de modelos positivos em suas vidas que tenham tentado seguir caminhos semelhantes. "Encontramos muitas jovens que tinham uma carreira em mente, mas que, por falta de modelos e pessoas que possam dar apoio emocional, como inscrição em exames e dicas de como preparar currículos, acabam sem referência de como continuar a trajetória", diz Machado. As barreiras externas acabam afetando mais homens, e são mais fáceis de ser resolvidas, avalia Müller. "Providenciar transporte público seguro e disponível e melhorar a qualidade da escola não vai resolver o problema. Temos também que enfatizar outras duas áreas problemáticas, somar aspirações e ação", diz a autora. "O ideal é trabalhar nas comunidades e mostrar mulheres que conseguiram outras coisas nas escolas e no trabalho ao lado da capacidade de agir. Temos exemplos de programas de mentoria ou apoio a jovens dentro da escola", ressalta. "Se você tem apoio, pode superar a vulnerabilidade. Os pontos de apoio podem ser escola, a comunidade, as famílias." Segundo o estudo, é importante tratar das normas de gênero nas famílias e comunidades, assim como individualmente. "Muitas das mulheres entrevistadas não conseguem imaginar uma vida em que seu papel não seja somente o de uma cuidadora, nem considerar desafios específicos relacionados a mudar suas vidas", afirma o texto.

                      

Fonte: Bem Paranã, 16 de março de 2018