REFLEXÕES TRABALHISTAS

Por 

Formalizado pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) em 1999, o conceito de trabalho decente sintetiza a sua missão histórica de promover oportunidades para que homens e mulheres obtenham um trabalho produtivo e de qualidade em condições de liberdade, equidade, segurança e dignidade humanas, sendo considerado condição fundamental para a superação da pobreza, a redução das desigualdades sociais, a garantia da governabilidade democrática e o desenvolvimento sustentável.

Trata-se de um conceito central para o alcance dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) definidos pelas Nações Unidas, em especial o ODS 8, que busca "promover o crescimento econômico sustentado, inclusivo e sustentável, emprego pleno e produtivo e trabalho decente para todas e todos".

O trabalho decente é o ponto de convergência dos quatro objetivos estratégicos da Organização Internacional do Trabalho (OIT), a saber: a) o respeito aos direitos no trabalho, especialmente aqueles definidos como fundamentais (liberdade sindical, direito de negociação coletiva, eliminação de todas as formas de discriminação em matéria de emprego e ocupação e erradicação de todas as formas de trabalho forçado e trabalho infantil); b) a promoção do emprego produtivo e de qualidade; c) a ampliação da proteção social; c) e o fortalecimento do diálogo social.

Foi no início da década de 2000, em face do discurso em favor da desenfreada flexibilidade das relações de trabalho, que procurava legitimar a difusão de novos tipos de informalidade e a redução do custo do trabalho, que a OIT lançou campanha internacional pela promoção do trabalho decente, reafirmando que o trabalho não pode ser entendido como mero fator de produção e que o mercado tão singular não pode ser autorregulado.

De acordo com a OIT, é importante e necessário o papel do Estado Democrático na consolidação de um padrão civilizado de relações sociais, baseando-se no pressuposto de que o trabalho continua sendo a via fundamental para a superação da pobreza e para a inclusão social, condição básica para uma vida digna e para o exercício da cidadania.

O objetivo prioritário da agenda do trabalho decente é difundir padrões de emprego caracterizados por um trabalho devidamente remunerado e capaz de garantir uma vida digna, exercido em condições de liberdade, equidade e segurança, com a eliminação de todas as formas de trabalho forçado, abolição do trabalho infantil e combate sistemático às distintas formas de discriminação em matéria de emprego e ocupação, extensão da proteção social e fortalecimento do diálogo entre empresas, sindicatos e governo.

As dimensões do trabalho decente, segundo a OIT, são: a) oportunidades de emprego; b) rendimentos adequados e trabalho produtivo; c) jornada de trabalho decente; d) combinação entre trabalho, vida pessoal e vida familiar; e) estabilidade e segurança no trabalho; e) igualdade de oportunidades e de tratamento no emprego; g) ambiente de trabalho seguro; h) seguridade social; 10) diálogo social e representação de trabalhadores e empregadores.

Mas não basta combater a informalidade pela formalização do contrato de trabalho, porquanto, é necessário garantir um patamar mínimo de direitos sociais e estimular a democratização das relações de trabalho.

A proposição do trabalho decente ganhou corpo na 16ª Reunião Regional Americana da OIT, realizada em maio de 2006, em Brasília, com a recomendação de políticas de combate à informalidade e para elevar o salário mínimo.

Nesse mesmo ano de 2006 foi definida a Agenda Nacional de Trabalho Decente no Brasil, pelo então Ministério do Trabalho e Emprego, estabelecendo como prioridades a implementação de ações para melhorar o padrão de emprego, com a valorização do salário mínimo e formalização do contrato de trabalho, reestruturação dos programas de proteção aos trabalhadores, atenção para os grupos mais vulneráveis, ampliação dos programas sociais voltados para o combate à miséria e à fome, com a adoção do programa do Bolsa Família.

Avaliando as políticas públicas do Estado brasileiro, em 2008 a OIT divulgou estudo sobre a situação do emprego, do desenvolvimento humano e do trabalho decente, mostrando a redução das precariedades no mercado de trabalho brasileiro, com a queda na taxa de desemprego, geração de empregos formais, redução da informalidade, aumento dos rendimentos do trabalho e retomada do emprego nas grande empresas.

Contudo, estudos posteriores da OIT sobre o trabalho decente mostram lacunas na legislação, déficits na geração de emprego e renda, falta de cobertura na proteção social e restrições à negociação coletiva.

Assim, é urgente a adoção de políticas públicas pelo Estado brasileiro para melhorar a situação do emprego e do trabalho decente, buscar a redução das precariedades no mercado de trabalho, a queda na taxa de desemprego, a geração de empregos formais, a redução da informalidade, o aumento dos rendimentos do trabalho, a valorização do salário mínimo e do diálogo social, pilares necessários ao atingimento da proteção social e do desenvolvimento humano, cujos efeitos são benéficos ao dinamismo econômico.

 é doutor em Direito das Relações Sociais pela PUC-SP, professor titular do Centro Universitário do Distrito Federal (UDF), mestre em Direito das Relações Sociais e Trabalhistas, membro da Academia Brasileira de Direito do Trabalho, consultor jurídico, advogado, procurador regional do Trabalho aposentado e autor de livros jurídicos, entre eles, Ação Civil Pública na Justiça do Trabalho.

Revista Consultor Jurídico

https://www.conjur.com.br/2022-set-23/reflexoes-trabalhistas-trabalho-decente-conceito-historia-objetivos-estrategicos